sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Cálculo de CG à partir de Pesagem

Tenho recebido várias perguntas a respeito de como calcular o CG de uma aeronave à partir de uma pesagem realizada. Os cálculos envolvidos são simples, tratando-se de determinar o peso total da aeronave e o momento total resultante da posição dos trens de pouso.

Quando uma aeronave é pesada, a balança é colocada em pontos específicos, determinados pelo manual de pesagem do fabricante. Algumas utilizam os trens de pouso e outras, pontos de apoio na fuselagem e/ou asas específicos para este fim.

Vamos considerar o exemplo de uma aeronave que é pesada com balança sob os trens de pouso. Para determinar o momento de cada trem de pouso, é necessário conhecer as distâncias entre o plano de referência (DATUM line) e cada um dos trens de pouso. A figura abaixo mostra essas medidas para uma aeronave Airbus A320.



Nessa caso, as distâncias são: 7,613m para o trem do nariz e 20,253m para os trens principais. Esses dados são obtidos no Weight and Balance Manual da aeronave.

Quando a aeronave é pesada, a oficina responsável pelo serviço emite um relatório de pesagem com a medição obtida em cada ponto de apoio. Esse documento é conhecido como Weight and Balance Report.

Vamos considerar o exemplo de uma aeronave Airbus 320 que apresentou os seguintes pesos:
Trem de pouso do nariz: 4.415kg
Trem de pouso principal esquerdo: 19.430kg
Trem de pouso principal direito: 19.550kg

De posse desses dados, é possível calcular o momento total da aeronave em relação ao plano de referência. Lembrando que: MOMENTO = FORÇA X BRAÇO, onde, neste caso, força pode ser substituída por peso. Então:

MOM nariz = 4415kg x 7,613m = 33.611,395 kgm
MOM trem esquerdo = 19430kg X 20,253m = 393.515,79 kgm
MOM trem direito = 19550kg X 20,253m = 393.946,15 kgm

MOM total = MOM nariz + MOM trem esquerdo + MOM trem direito
MOM total = 33.611,395 + 393.515,79 + 393.946,15
MOM total = 823.073,34 kgm

Pode-se, também, calcular o peso total da aeronave:

Peso Total = Peso Nariz + Peso Trem Esquerdo + Peso Trem Direito
Peso Total = 4.415 + 19.430 + 19.550
Peso Total = 43.395 kg

Voltando à equação MOM = FORÇA X BRAÇO, é possível manipulá-la algebricamente para obter:

BRAÇO = MOM / FORÇA

Ou seja, é possível calcular um ponto de apoio equivalente onde, caso todo o peso fosse aplicado, a aeronave permaneceria em equilíbrio. Ou ainda, caso a aeronave fosse suspensa por esse ponto, sairia do chão em equilíbrio, sem tendência de inclinar-se para frente ou para trás.

Usando os dados obtidos, temos:

BRAÇO = 823.073,34 / 43.395
BRAÇO = 18.967m

Com o braço do CG determinado, é possível calcular o CG em relação à corda média aerodinâmica (MAC) da asa. Para isso, é necessário conhecer a estação inicial da corda, chamada de MAC Leading Edge e o seu comprimento, chamado MAC length.

Para um Airbus A320, MAC LE = 17.8015m e MAC length.

A fórmula para determinar o CG (%MAC) é: 

CG (% MAC) = (BRAÇO - LE MAC) / MAC LENGTH * 100

Sendo assim, no caso estudado:

CG = (18.967 - 17.8015) / 4.1935 * 100

CG = 27,79 % MAC

Espero que esse exemplo ajude a esclarecer as dúvidas a respeito de cálculo de CG.

Até breve.



6 comentários:

Unknown disse...

Cmte Medau,

Fiquei com uma dúvida na seguinte parte:
Trem de pouso principal esquerdo: 19.430kg
Trem de pouso principal direito: 19.550kg

é normal considerar pesos diferentes entre o MLG esquerdo e direito? Sempre aprendi que não realizamos a parte lateral do CG (diferentemente do helicoptero) nesse caso devemos desprezar a diferença de peso?

Atenciosamente,

André Collaço

João Carlos Medau disse...

Olá,

A diferença é muito pequena (da ordem de 0,6%) entre um lado e outro. Essa diferença ocorre em função de abastecimento assimétrico (por exemplo) das asas, equipamentos instalados, etc.

Apesar de pequena, a diferença não deve ser desprezada. Uma vez que o braço do trem principal é o mesmo para os dois lados, basta somar os pesos das duas balanças do MLG antes de multiplicar pelo braço.

abcs,

Medau

Unknown disse...

Cmte Medau,

Obrigado pela atenção com as minhas dúvidas, queria aproveitar para aprofundar na questão do CG.

Quando em vôo, como é possível calcular o posicionamento do mesmo, assim como prever o seu deslocamento devido ao consumo de combustível e garantir que não saia dos limites??

Obrigado pela atenção,

André Collaço

João Carlos Medau disse...

Olá,

O cálculo do CG em voo segue exatamente os mesmos princípios do avião no solo. O CG em um dado momento do voo é dado pelo CG de decolagem corrigido para a variação causada pelo consumo de combustível mais a variação gerada pelo posicionamento dos comissários e trolleys, que se movimentam.

Pensando rapidamente, num avião a jato, de asa enflechada, o consumo de combustível faz o CG deslocar-se para a frente, já que o combustível das pontas é consumido primeiro e a raiz da asa fica mais à frente do que as pontas.

O RBAC 121 exige que sejam feitos cálculos que garantam que o CG estará dentro dos limites durante todas as fases do voo, incluindo decolagem, pouso e voo após todo o combustível ter sido consumido (zero fuel CG). Para facilitar isso, na engenharia de operações fazemos um cálculo conhecido como "corte de envelope", onde o envelope de CG original do avião é reduzido um pouco, para que essas variações em voo não extrapolem os limites.

Isso não é tão trivial de explicar, então, vou tentar fazer um post a esse respeito, assim que tiver um tempo.

Se tiver mais perguntas, manda ai.

Abcs,

Medau

Unknown disse...

Estou esperando ansiosamente o seu post Cmte.

Se possível surgiu outra dúvida, no caso de um vazamento de combustível em vôo (ou qualquer alteração não prevista inicialmente), como se determina a maneira que esse evento irá afetar o CG?

Abraços,
André Collaço

João Carlos Medau disse...

Olá,

Como eu disse, as únicas coisas que se movem em voo são:

- Trens de pouso (recolher e abaixar);
- Flaps (recolher e abaixar);
- Comissários que se movimentam;
- Trolleys que são movimentados;

Todas essas variações são previstas no corte prévio do envelope de CG e, portanto, não excedem os limites por já terem sido previstas.

A diminuição de combustível implica em uma variação conhecida do CG, seja por consumo ou vazamento. Antes da decolagem é obrigatório calcular o CG para os pesos de decolagem (TOW), pouso (LDW) e zero combustível (ZFW). Então, mesmo que a aeronave consuma ou perca todo o combustível que tinha na decolagem, ainda assim, terá o CG dentro do envelope (ref RBAC 121.693).

Obs: Existe, no manual de voo do avião, um procedimento a ser cumprido em caso de desbalanceamento de combustível e também uma limitação de assimetria máxima entre as asas mas a razão para essa limitação não é o CG e sim amplitude de comandos de voo e manobrabilidade.

abcs,

Medau